.
Por Isabel Fleck
Retirado da Folha de S. Paulo, quinta-feira, 10 de dezembro de 2015
.
‘Não há vida cristã possível em locais dominados pelo EI’, diz arcebispo sírio.
A perseguição se tornou rotina para a minoria cristã desde que facções extremistas islâmicas, em especial o EI, começaram a ganhar força na guerra civil que assola a Síria há mais de quatro anos.
No início deste ano, a igreja católica Greco-Melquita na Síria — à qual dom Jean-Abdo [arcebispo católico das cidades sírias de Homs, Hama e Yabroud] pertence e que também responde ao Vaticano — divulgou que, só em 2014, mais de mil cristãos tinham sido mortos e dezenas de igrejas e centros cristãos destruídos.
Os cristãos representam cerca de 10% da população e hoje, em cidades com forte ação do EI, como Raqqa e Aleppo, os cristãos se dispersaram, foram forçados a se converter ao islamismo ou foram mortos.
“Quando os terroristas conquistam um território, colocam três condições para os cristãos: o pagamento de um imposto, a jizya, a conversão ou o martírio”, diz dom Jean-Abdo.
“Não há vida cristã possível em locais dominados pelo EI”.
Segundo o religioso, os diferentes grupos extremistas que atuam na Síria têm formas de atuação distinta contra suas vítimas.
“Há os que usam a execução imediata. Outros preferem torturar as famílias com telefonemas e ameaças. Mas o mais cruel é quando matam os pais na frente dos filhos”, diz, lembrando o caso de um rapaz de sua comunidade que foi obrigado a ver a mãe ser decapitada pelos radicais.
Os cristãos começaram a retornar a suas cidades, entre elas Yabroud, após sua retomada pelas forças de Bashar al-Assad, no início de 2014.
Iniciaram então o trabalho de reconstrução das igrejas e de escolas cristãs, com a ajuda de doações de organizações internacionais.
“Os extremistas quebraram todas as cruzes, cortaram a cabeça de todos os santos”.
Para dom Jean-Abdo, não há diálogo possível com os terroristas — como chama todos os grupos radicais, não só o EI.
“O diálogo deve ser com os países grandes que mandam ajuda financeira ao EI”, diz, sem querer citá-los.
Como toda a minoria cristã, dom Jean-Abdo defende a permanência de Assad — que também pertence a uma minoria, a alauita, e sempre protegeu esses grupos no país.
“Se o Assad sair hoje, quem vem? O que vai acontecer na Síria? O que ocorreu na Líbia?”, diz, referindo-se ao caos político gerado no país africano após a queda do regime Gaddafi.
“Além disso, a Síria é um país independente, e o presidente foi eleito pelo povo”.
O religioso rechaça as acusações de violações de direitos humanos e de crimes de guerra cometidas pelo regime. “Há cerca de 80 países combatendo hoje dentro da Síria. Assad será o culpado [pelas mortes]?”
Em sua fala, o líder católico demonstra que a incerteza dos cristãos sobre o futuro reforça ainda mais o apoio ao atual governo.
“Não dá para adivinhar quem virá e como vai agir. Se for como o que ocorreu inicialmente no Egito, com um presidente ligado à Irmandade Muçulmana, iria piorar a situação [dos cristãos] sem dúvida”.
No Brasil, dom Jean-Abdo celebrou uma missa na Basílica de Nossa Senhora Aparecida, no interior de São Paulo, no último domingo (6).
Pediu aos brasileiros que rezassem pelos sírios.
.
* * *
,
,