A Virgem Maria: o modelo perfeito da mulher cristã (parte 2)


Maria perante a triste situação social pagã
Até onde ela era esposa e mãe, isto é, onde tinha direito ao respeito e veneração, na Roma coberta de mármores de Paros, onde os raios oblíquos do sol poente aspergiam de sangue os templos dedicados a todas as virtudes e todos os vícios, e na Judeia em que o homem não ouvia outro ruído senão a voz dos pássaros e os lamentos da água, esses augustos títulos não a preservavam da escravidão.
Podia perdê-los em um dia pelo repúdio. Aliás, o nome de esposo, em realidade sempre diminuído, pertencia somente a um pequeno número de privilegiadas, às quais valia mais como aparato que como afeição. O mais, confundia-se numa indescritível opressão de carne e sangue.
Cedia-se lugar à matrona romana, cujo resplendor triunfal de realçada beleza aparecia sob o véu descido, e cujo corpo envolvido por simples manto emergia de um carro dourado.
Escoltavam-no em procissão ao Capitólio. Em casa, estava sob tutela, sujeita como os filhos aos rigores do tribunal doméstico. Os filhos não elevam sob o seu poder; ela os dava ao mundo, mas não era ela que lhes podia conservar a vida. O pai dispunha deles como bem lhe a prouvesse. Podia relega-los, matá-los sem que lhe fosse permitido depor um beijo no semblante daquele a quem acabara de dar à luz. Não podia fazer testamento nem herdar um bem matrimonial.
Por toda parte desconfiavam dela e a única liberdade que possuía era a de descer oficialmente no rol das prostitutas.
Quanto às escravas, não lhes concedia a lei, proteção alguma; os costumes, piedade alguma; passaram arrastadas pela vertente de sua frívola juventude; umas com a resignação fatalista que logo tomava o partido do inevitável; outras com o instinto prático das aranhas que não contam as teias rasgadas, recomeçando sempre a urdir novas. Mergulhadas todas na devassidão e não tendo senão o vicio para libertá-las e conservar-lhes a liberdade!
Eis o destino das mulheres em Roma, na época mais brilhante da civilização romana, na época em que o ouro e o mármore cobriam a capital do Império. Para qualquer lado que lancemos os olhares sobre o universo, encontramos sempre um mundo mergulhado no sangue e no estupro.
A mulher desprezada e, portanto, o homem, acorrentado pelo desejo, prostrando-se diante de seu instinto. O que fizeram essas escravas, a historia nô-lo conta. Seus nomes sobrenadam em um lago de ignomínia e de impureza.

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E não acontece hoje o mesmo com as mulheres que, abandonando o Senhor, renegam as partes superiores de sua alma para viver com os cínicos e implacáveis que as conduzem à desgraça; não acontece o mesmo quando se submetem friamente a todas as torpezas para atingir seu fim, para adquirir um novo meio de domínio, para acumular o dinheiro que é uma força?
Quando passam dos braços dos potentados da finança aos dos potentados da política, quando envolvem de mistério e habilidade sua vida insípida? São estas as que, como no tempo dos Césares, dirigem o mundo nos salões, porque depressa vêem a fraqueza do deus que as admira, e que elas reconhecem aviltá-las?
Não acontece o mesmo quando, esquecendo seu papel de cristãs, vivem na obstinação de nada perder dos bens adquiridos, a jogar simultaneamente e até ao fim com todos os compromissos, a pôr em risco a alma, se necessário, antes que negar-se a toda fantasia perigosa? Seu beijo não é mais a ternura de um amor virginal, mas o selo de uma vontade que assinala um instrumento para o ato que ordena.
Sua companhia não é mais a intimidade de uma vida colocada em Deus, mas o tumulto das paixões reprimido sob uma fria reserva; o júbilo de escutar o surdo trabalho de aviltamento, um só preparo a dissolver, junto a seu vestido, a força de um homem.
Que alegria para essas mulheres ver tombar um carvalho, tocando-o com a luva e que homem, não sendo cristão, resistiria a tal tentação?
Tal era a mulher antes de Cristo Jesus, tal nos aparece ainda hoje quando olvida o grande mistério da Encarnação, tal se acha em todas as sociedades em que o sol da Redenção não penetrou as trevas; tal ela se torna em todas as sociedades donde se retira este sol.
À parte alguns sinais de respeito exterior que certas religiões concedam à mulher, achamos por toda parte, fora do Cristianismo, o concubinato, a poligamia, o repúdio, o sequestro.
A mulher, reduzida à mais aviltante domesticidade, ignorante, desprezada, sobrecarregada de trabalho na pobreza e de ociosidade na riqueza, reúne a todas as misérias morais, imensa degradação intelectual e moral. Seus vícios parecem justificar o rigor de seu destino.
Daí as desordens, as desgraças particulares, as catástrofes públicas, segredos das incompreensíveis reviravoltas das fortunas e felicidades públicas e privadas, segredos explicados de tantas maneiras pelos psicólogos e políticos, porque é necessário não esquecer que a voluptuosidade não é estéril, mas gera sempre uma filha: a ferocidade.
Estando a mulher fora da sociedade e relegada a um segundo plano, resulta na privação de duas coisas cuja ausência é fonte de males incalculáveis: falta, à sociedade, a base sagrado da família; e, no homem, a sublime virtude depositada por Deus em seu coração: humanidade.
O Evangelho de Cristo Jesus fez com que a mulher fosse reintegrada na sociedade, de onde fora excluída.
Chegou a transformá-la pela liberdade e por algo de mais maravilhoso que a liberdade: pelo amor. Tudo o que a sabedoria romana, com o voluptuoso Horácio que reclamava duas vezes a morte para a vestal perjura, se esforçava por obter, era alguma estéril qualidade enxertada em uma árvore, apodrecida.
Havia algumas considerações de justiça e dignidade nesse mundo de utopia, que parecia esboçado sobre alguns traços vagamente percebidos na história de nossos primeiros pais. Mas César ignorava o verdadeiro amor e, por outro lado, a liberdade fascinava esse sensual.
Foi o Cristianismo que se dirigiu diretamente à liberdade e ao amor e lhes exigiu virtudes que o homem não acreditava possíveis nem em seus deuses. Sobre a nova terra, floresceram essas duas virtudes. A mulher escrava torna-se a virgem, a esposa, a mãe, a santa, a mártir cristã.
E a Virgem Maria, estabelecida no Calvário Mãe de todos os homens, ergue a pecadora que sofre, e consola a mãe que geme.
Maria como modelo feminino previsto por Deus
Considerando essa maravilhosa transformação, que homem sensato não experimentará o imenso reconhecimento do Apóstolo São Paulo?
Era espantosa e agitada a noite, mas eis que se desfaz e vai espalhar-se o dia, trazendo consigo a paz. Não é Maria esta bela aurora que nos traz a plena luz, Maria que vem arrancar do coração da mulher o germe renascente de suas paixões para nela fazer desabrochar todas as flores primaveris e depor em sua fronte todas as estrelas do Céu?
A queda começara pela mulher; é pela mulher que se anuncia e começa e Redenção. Eis a nova Eva que traz o novo Adão. Aparece, bela e pura como delicioso perfume a flutuar nas manhãs de maio, tão enamorada da castidade que deseja permanecer virgem sob uma lei e em meio a um povo onde a esterilidade era uma desonra; tão respeitada por Deus que Este, para honrá-lA com a divina maternidade, pediu-Lhe o Seu consentimento.
Descendente do sangue real de Davi, Maria era humilde; tendo descido a uma condição obscura, aceitava, sem murmurar, a pobreza; dotada do espírito profético, silenciava; Sua beleza, celebrada pelos anjos, estava oculta aos olhos do mundo. Seu esposo era um justo que haveria de guardar a Sua virtude.
Vivia em uma pobre casa, com o trabalho de Suas mãos; submetia-Se a todas as leis, a todas as observâncias, e purificava-se publicamente após ter levado em Seu seio e dado à luz o Verbo de Deus.
Em uma época de inteligência obscurecidas, de ações desregradas, em que a humanidade não procurava senão o dinheiro, Maria, Mãe de um Filho todo-poderoso, não Lhe pedia nem os esplendores do mundo nem as riquezas efêmeras, aceitava simplesmente d’Ele as angústias e ignomínias, aceitava os sete gládios que Lhe haviam de transpassar o coração, e  que conservaria até que Deus a chamasse finalmente para Si, permitindo-Lhe sofrer também a morte.
Lei última desta vida durante a qual, embota preservada de toda mácula do pecado, Ela suportara entretanto, como o Messias, as penas do pecado.
Eis a Mulher tal como Deus a restitui ao mundo; eis a Virgem por excelência, a Mãe cheia de amor, a Virgem resignada em todas as provações da vida.
Se Deus a rodeou de tal glória, se A cumulou de um brilho celeste tão maravilhoso, se Lhe conferiu tantos privilégios divinos, é porque Maria Lhe pertencia inteiramente; se A submeteu à dor, se A mergulhou na provação, pronta a seguir-nos para realizar conosco a nossa tarefa, a nossa missão na fé e no amor, é porque Ela era para nós.
Era necessário que todas as situações legítimas da vida da mulher fossem santificadas na Virgem Maria, porque necessário era que todas as mulheres pudessem encontrar o seu modelo e não pudessem nem elevar-se a tal estado de grandeza nem cair em fantasias de um idealismo mal compreendido, sem que vissem por toda parte a Mãe de Deus, humilde, laboriosa, casta, fiel, resignada, obediente.
Não devemos esquecer que Maria não está sozinha junto à Cruz em que Seu Filho expira pelos pecados do mundo; Ela não está somente com o Apóstolo irrepreensível. Ali chora, prostrada, a pecadora, e a Mãe de misericórdia não afasta de Seu vestido aquela que, chorando, beijou os pés de Seu Filho e neles derramou perfumes mesclados de lágrimas, enxugando-os com seu cabelos.
E, no entanto, imaginemos a civilização brilhante da época em que surgiu Maria em toda a grandeza de Sua simplicidade e de Seu amor.
Na Roma de Augusto que contava alguns milhões de habitantes, para três quartos dos homens não existia a família, e ninguém gozava a sua sagrada plenitude. O nome de mãe de família significava prostituta. Em toda a Grécia, votada ao culto do amor impudico, o amor conjugal não possuía um templo, e fora impossível encontrar seis meninas virgens, dos seis aos doze anos, que quisessem aceitar as prerrogativas acumuladas sobre a cabeça das vestais.
Foi necessário admitir as filhas de libertos a esse sacerdócio durante longo tempo reservado ao patriciado, ou antes, foi necessário impô-lo por um ato ditatorial. Sem dúvida, seria uma espécie de injustiça exigir de tais mulheres a pureza cristã, ou mesmo a luta constante e corajosa contra o pecado, ou enfim o arrependimento interior e profundo de uma alma vencida pelo pecado.
Mas seus costumes não eram simplesmente maus costumes como hoje os entendemos. Eles não se contentavam em ceder à natureza, violavam-na. Não se defendiam; não se envergonhavam.
Alguns anos após, esta mesma Roma, conforme a bela expressão de Santo Ambrósio, contava em seu seio todo um povo de virgens que, a perder sua virgindade, preferiam a morte, como a sabiam dar os carrascos de Nero.
Os anais do Império mencionavam alguns nomes de mulheres que pareciam ter conservado um reflexo de honra e de virtude; mas, ergueu-se o Cristianismo, e o mundo, cuja baixeza era somente comparável à corrupção, transformou-se em um viveiro de santos e de santas, dignos de memória eterna.
Para transformar a carne e o sangue, eram necessários os braços dos mártires; para curar o mundo, seu sangue generoso, que pelo batismo se tornara o sangue de Cristo, formado no seio de uma Virgem Mãe: Maria.
O que viram os primeiros séculos e causou a admiração do mundo inteiro, viram e admiraram todos os povos, todas as gerações cristãs. E as que virão chorar sobre nossos sepulcros cobertos de musgo, ainda o verão e admirarão como nós.
A decadência moral pela rejeição a Maria
O culto da Virgem Maria permanecerá para os homens a força capaz de sustentar a sociedade que se liquefaz ao ímpeto dos sábios, que se arrogam mais liberdades que os pagãos dos primeiros séculos, pois fazem guerra ativa ao Cristo paciente e desarmado, ao Filho da Virgem puríssima. Esse culto conservará a família, salvará a sociedade.

Malgrado a lamentável educação dada à nossa juventude de hoje pelos pais que não rejeitam a Deus, que não Lhe querem fazer guerra mas que simplesmente se decidem a esquece-lO, ignorando que Deus não os esquecerá; malgrado a falsa ciência que contesta os milagres, ora por uma brutal negação, ora por injuriosas explicações, declarando que o milagre não é aceitável nem na história nem na filosofia.
Malgrado o orgulho do homem que recorda em sociedade as imprecações dos profetas para fazer-se admirados; malgrado 0 prazer que desperdiça as loucas generosidades do coração e passeia seu desejo pelas culminâncias do sonho; algo o retém ainda e limita o terrível poder que lhe é concedido de separar-se inteiramente de Deus.
Aí está a mulher cristã, virgem, esposa, mãe, com as mãos estendidas para Maria, os olhos erguidos para Ela, humilde nas riquezas, paciente nas maiores dores, corajosa nas desgraças, fiel a seus deveres, devotada até àqueles que se utilizam da mentira para acreditar uma moral sem Deus.
Ela aí está, toda poderosa pela fé que a consola e a torna incomparavelmente bela, como as orquídeas da floresta russa que nenhum olhar ofende, impregnada de sua graça selvagem e de seu casto perfume.
A mulher que ora, que espera e sofre pacientemente, triunfa sempre. Com suas virtudes, possui direitos, legítima conquista das mesmas, que não lhe podem ser arrancados sem regredir às voluptuosidades da Sardanápale ou no epicurismo de Sócrates.
Mãe que arma 0 coração de seus filhos consagrados a Maria, sabe que nas almas lavadas pelo batismo, mas recusando a evidência da verdade para se associarem aos pecadores em seus passageiros extravios, conservarão a energia capaz de lhes mostrar, um dia, a bondade e o amor da Santíssima Virgem e de reconduzi-los aos pés de Seu Filho. Aquele que não está envolvido pelo hábito não está sepultado.
Assim, o mundo sabe o que faz quando procura diminuir, renegar, banir o culto da Virgem Maria! Quer expulsar o anjo da família, para lhe devolver a paixão desenfreada dos vícios que agitara o espírito das sociedades e amadurecem no povo as grandes revoluções.

Perdendo o amor de Maria, perde a mulher suas consolações, em seguida sua fé, suas virtudes, para exibir-se como Pílatos e Batila em todos os “dancings” e salas de espetáculo. Em breve também a  indissolubilidade do laço conjugal parece fardo excessivamente pesado para a liberdade das instintos.
O matrimônio não é mais senão um contrato temporário para satisfazer as ternuras que sobrevivem no âmago de dois corações. A mulher recai no desprezo, na servidão, foi atingida a família. Estando ai a desordem, não tardará a manifestar-se por toda parte onde o desejo exasperado fala mais alto que a razão, e onde a imaginação, fascinada por tudo quanto há de delirante, neste mundo, sacrifica a virtude a uma fantasia de idealismo mal compreendido.
Seria inútil combater aqui as opiniões dos que consideram o culto da Virgem como exagero introduzido pela Igreja Católica.
Para nós, o que a Igreja faz, está bem feito; e esta pretensa novidade que lhe censuram não é senão uma luz perfeita dada à vida eterna, e uma infatigável claridade que conduz à evidência. Mas os que tivessem necessidade de outra razão, para satisfazer a sua inteligência, digam-nos: por que, em toda parte onde se enfraquece o culto de Maria, diminuem as obras normais do Cristianismo? Por que desaparecem onde este culto não mais existe? Por que aumentam, onde já existe?
Os fatos aí estão e a razão, a pobre razão humana por si só, por pouco que deles se queira servir, bastaria para repelir essas miseráveis asserções que, sob pretexto de mais honrar a Deus, se esforçam por diminuir a glória da Virgem Maria.
Se Deus formou com tanto cuidado a Sua Mãe, é porque A desejava parte essencial na obra de nossa Redenção, é porque desejava nos inclinássemos diante do mistério, reconhecendo-O Senhor da vida e da morte.
O espírito se apavora ao pensar no que faltaria ao mundo há dezenove séculos, se lhe faltasse a beleza, a doçura, o divino encanto e a divina força da virgindade e do amor que nele esparge a figura da Virgem Maria.
Basta ler o Evangelho para compreendê-lo e é por esta razão que desejei narrar a Sua vida, simplesmente haurindo neste livro que venceu o erro, a força de minha argumentação. Não sobrecarreguei de notas essas páginas que a boa fé dirige à boa fé. Cito com exatidão, sem indicar os textos dos Padres e dos outros escritores católicos, de que amplamente me utilizei, mas que muitas vezes reuni, dois ou três, em uma frase única, para maior rapidez.
Quis um livro para todos os homens, um livro que todos possam ler e compreender.
Ó Virgem Maria, os que Vos desprezam, hão de bendizer-Vos! Possam eles implorar-Vos antes que chegue o dia da justiça de Vosso Divino Filho.
Possam eles, neste tempo de Vossa bondade, desejar o Vosso Amor que sempre Lhes é oferecido. Possam eles ser colhidos nas doces malhas de Vossa misericórdia, eles que se esforçam por afastar os outros dos caminhos da luz e do perdão!
Oh! Vós que consolaste tantas dores indescritíveis, aparaste e sustentaste tantas fraquezas incuráveis, purificaste tantas e a Vós voltaste inquietas ternuras, tantos amores infelizes que perturbam e seduzem os corações, sê para a virgem órfã o refúgio e amparo, para a esposa abandonada a confidente e amiga, para a mãe que perdeu seus filhou ou que treme de perdê-los pelo pecado, a consoladora de todos os instantes, para a viúva, a perpétua guardiã; para todos nós, o raio de esperança em meio a esta vida.
Sê, ó Virgem Santa, a fascinante Estrela que conduzirá os povos, cegos pelo materialismo, às claridades eternas.
Rabat.
23 de Janeiro de 1945.
Festa das Núpcias da Bem-aventurada Virgem Maria,
 
Fonte: blog a grande guerra

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