Chegando a Lourdes, um instinto misterioso conduz o neófito rumo à Gruta. Os cartazes são inexistentes e desnecessários.
Os guardas são escassos e sem trabalho. A multidão é ordenada, composta e fervorosa. Tudo é pulcro e bem conservado.
Magotes de peregrinos convergem para o local das aparições. Uns rezam em grupo ou isoladamente, em voz alta ou baixa; outros cantam.
Ainda outros caminham em atitude recolhida, ou com ávida curiosidade, até o fulcro dessa unção que a tudo envolve maternalmente.
Não há algazarra nem pesado silêncio. Há uma plenitude de vida harmoniosa, impregnada de sobrenatural, que empolga.
Alguns chegam acompanhados de um sacerdote. A imensa maioria vem por iniciativa própria.
O que os levou lá? O que a graça disse na alma daquele romeno, australiano, japonês, brasileiro ou sul-africano, para virem de todos os recantos da Terra a Lourdes, com tanta consonância de espírito?
À direita de quem chega, o caudaloso rio Gave corre impetuosamente, emitindo leve murmúrio, imagem material dessa torrente de graças que ali age tão poderosa e discretamente nas almas.
À esquerda estão as numerosas torneiras onde os romeiros colhem e bebem a água da fonte aberta por Santa Bernadete por ordem de Nossa Senhora.
Logo a seguir, a Gruta das aparições. Como descrevê-la? É difícil. Nada há nela que não se pareça com mais uma concavidade lavrada na rocha pelo vento e pelas águas.
Porém, olhando-a, tem-se a impressão de contemplar uma janela que abre direto para o Céu.
No alto, à direita, numa espécie de túnel aberto na rocha, a famosa imagem de Nossa Senhora de Lourdes, tão simples, sem mérito artístico especial, irradiando um oceano de graças.
No canto inferior à esquerda, no fundo, a fonte que Santa Bernadete cavou com suas próprias mãos, a mando de Nossa Senhora.
A água jorra límpida, incessante, com a musicalidade aconchegante de um despretensioso manancial de montanha.
Eis a água de Lourdes, eis o simples instrumento de que Nossa Senhora se serve para vencer a doença e o pecado, a lubricidade igualitária da humanidade que recusou a Civilização Cristã.
Que contraste! Que glória, que poder da Santíssima Virgem! Toda a obra de impiedade erigida em séculos de Revolução, vencida pela Rainha dos Céus e da Terra com um simples fio de água!