Continuação do post: Comemore o dia do Imaculado Coração de Maria com esta importantíssima reflexão; leia aqui: (Parte I)
A sapiencialidade do Coração de Maria
Esta virtude da sabedoria é uma virtude que contém, portanto, todas as outras virtudes, e ela está posta no primeiro mandamento da Lei de Deus.
Quando o Decálogo nos diz “amarás ao Senhor teu Deus, de todo teu coração, de toda tua alma,
de todo teu entendimento” etc., etc., ele nos prescreve sermos assim, e era assim que era
Nossa Senhora.
O Coração dEla, quer dizer a alma dEla, a mente dEla era soberanamente elevada, soberanamente grande, soberanamente séria, soberanamente profunda, porque era assim.
Ela era o Vaso de Eleição no qual pousou o Espírito Santo para fazer Seu casto conúbio com Ela e gerar a Nosso Senhor. E uma das poucas coisas que nós conhecemos (através do Evangelho) como dita por Nossa Senhora, é uma verdadeira maravilha de sabedoria, é o Magnificat.
O Magnificat: exemplo de oração contra-revolucionária
Em outra ocasião já fiz aqui uma análise do Magnificat e não é o caso de fazer neste momento, mas eu gostaria de mostrar apenas o que há de sapiencialidade na primeira palavra do Magnificat.
Magnificat quer dizer “engrandecer”.
“Magnificat anima mea Dominum” quer dizer “a Minha alma engrandece o Senhor”, ou em outros termos: “Minha alma está enlevada com a grandeza do Meu Senhor, ela adora o Meu Senhor na sua perfeita e insondável grandeza, e ela dá um aumento extrínseco a essa grandeza cantando a grandeza do Meu Senhor”.
A palavra com que Ela irrompe o seu cântico é um cântico de grandeza, é um cântico de uma alma nobilíssima, e que voa para considerar a Deus nos seus mais altos aspectos.
E depois volta, por um contraste harmônico e maravilhoso, para a consideração de seu próprio nada: “Minha alma engrandece o Senhor e o meu espírito exultou em Deus meu Salvador”.
Por que? Porque “considerou a humildade de sua escrava e por causa disto todas as gerações me chamarão Bem-aventurada”. Os senhores estão vendo que beleza isto!
Como, pela sabedoria, Ela mediu toda a grandeza de Deus e se alegrou nisto tanto quanto uma mente criada pode medir a grandeza de Deus; como, de outro lado, Ela mediu sua pequenez, e então diz: Eu me alegro em Deus meu Salvador porque Ele olhou para a pequenez de Sua Escrava.
É um poema de Contra-Revolução que se encontra nisto.
É a escrava que se encanta de ser pequena, e se encanta de ver como Deus é infinitamente superior a Ela, e do fundo de seu nada dá glória a Deus.
E depois diz: Meu espírito exultou nEle porque Ele olhou para Mim que sou tão pequena.
Vê-se aqui o pequeno que reconhece a sua pequenez, e que gosta de ser pequeno, que não se revolta, que não se indigna, mas que se coloca no último dos últimos lugares, no último dos papéis.
Nada existe de mais vil do que o escravo: o escravo é um nada, ele não tem direitos, ele está colocado abaixo da condição comum do homem (*). Pois Nossa Senhora se proclama Escrava de Nosso Senhor, Precursora de todos os escravos dEla que Ela iria ter ao longo dos séculos.
Ela se encanta de ser nada, se encanta de ser escrava do Senhor: foi à pequenez desta criatura e de uma criatura escrava que Meu Senhor se dignou deitar os olhos, e por isto eu exulto, porque sou pequena e porque Deus é grande e porque a grandeza amou a pequenez.
Vejam como isto é profundamente contra-revolucionário e, para dizer tudo numa palavra só, é profundamente o oposto do espírito da Revolução Francesa, do espírito do comunismo. Tão oposto que é quase até uma blasfêmia fazer uma comparação.
Aí está a verdadeira humildade, que ama o seu lugar, ama a pequenez do seu lugar, mas adora a grandeza e se eleva com a grandeza, ainda que não seja dona da grandeza: pelo contrário, proclama que a grandeza é dona dEla.
É isto que meditamos quando consideramos o Coração Sapiencial de Maria.
É um tema especial para a nossa meditação. Pedir a Nossa Senhora que Ela nos faça puros como Ela, que Ela nos faça sapienciais como Ela, que Ela nos faça amar a nossa pequenez, que Ela faça que nós tomemos a sério e até às últimas conseqüências a nossa escravidão a Ela (**).
Que, de outro lado, nós lembremos da grandeza dEla e de todas as grandezas que não são as nossas, porque assim a grandeza se debruça sobre nós e nos olha.
E nós podemos nos encantar com este debruçar-se amoroso da grandeza sobre a pequenez. Isto é a meditação para a festa do Sapiencial e do Imaculado Coração de Maria.
(*) Sobre a questão da “escravidão”, no “Tratado da Verdadeira Devoção a Nossa Senhora”, quando São Luis Maria Grignion de Montfort trata da “escravidão de amor a Nossa Senhora”, usa como analogia a situação do escravo diante de seu senhor.
Uma nota de pé de página da referida obra explica a expressão, e cremos que tem todo cabimento aqui transcrevê-la, para esclarecer o sentido em que o Prof. Plinio usa o termo:
“A lei natural, a lei mosaica e as leis modernas não reconhecem tal direito, a não ser por um mandato especial do soberano Senhor da vida e da morte.
O bem-aventurado se coloca aqui simplesmente do ponto de vista do fato, conforme as leis civis dos países em que vigorava a escravidão (Cf. Secret de Marie, p. 34).
Abstraindo da moralidade do ato, seu fito é mostrar, por um exemplo, a total dependência de que fala” ( Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem por São Luis Maria Grignion de Montfort; Capítulo II; Artigo II:”Pertencemos a Jesus Cristo e a Maria na qualidade de escravos”. Editora VOZES Ltda – Petrópolis – RJ; VI edição, pág. 76 ).
(**) O Prof. Plinio refere-se à “Escravidão de Amor a Nossa Senhora”, cf. doutrina e método de São Luis Maria Grignion de Montfort.
Mais detalhes sobre o conceito podem ser lidos no artigo Obedecer para ser livre, publicado na “Folha de São Paulo” em 20 de setembro de 1980, ou ainda na coletânea de escritos do Prof. Plinio sobre São Luis Grignion na seção “Especial” do site www.pliniocorreadeaoliveira.info
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