Como explicar entretanto que esse mesmo Jesus tivesse suscitado tanto ódio? Porque, inegavelmente, Ele o suscitou. Os judeus O odiaram com um ódio envergonhado, devorador e infame, qual só o inferno pode gerar.
Por ódio, procuraram longamente espioná-Lo, a fim de ver se encontravam n’Ele alguma culpa, que lhes servisse de arma de guerra. Prova de que não O odiavam por algum defeito que por engano n’Ele imaginassem ver.
Porque então O odiavam? Se não era pelo mal, que n’Ele não havia, e que n’Ele em vão procuravam, porque seria? Só poderia ser pelo bem… Mistério profundo da iniqüidade humana! Este ódio era envergonhado.
Com efeito, ocultavam-no sob a aparência de amabilidade, porque não tinham nenhuma razão limpa e honesta para o declarar. À medida que a missão de Jesus foi caminhando para a sua plena realização, o ódio dos judeus foi crescendo de ponto, e tendendo para uma estrondosa explosão.
Desanimando de encontrar razões de difamação, recorreram à calúnia. Dela usaram largamente. Tinham tudo para vencer nesta forma de luta: dinheiro, relações com os romanos, prestígio decorrente do exercício das funções sagradas. Entretanto, a guerra pela calúnia fracassou em grande parte.
Conseguiram convencer alguns despeitados, semear a dúvida em alguns espíritos grosseiros, embotados, ou viciados em duvidar de si, dos outros, de tudo, e de todos. Mas era impossível afogar em calúnias o efeito maravilhoso da presença, da palavra e da ação de Nosso Senhor.
E então veio o plano supremo: desmenti-Lo por uma derrota que O desprestigiasse aos olhos de todos, e O cortasse do número dos vivos. O resto se sabe. Satanás entrou no mais repugnante dos homens, que O vendeu e depois O entregou com um ósculo. Um procônsul depravado mais ainda de alma que de corpo, hesitante, mole, vaidoso, entregou-O a seus inimigos. E sobre Ele caiu a torrente de todo o ódio da Sinagoga, com que afinal os fariseus haviam conseguido contaminar a massa.
Que ódio, e que alívio. Ali estavam, urrando de ódio, tantos cegos e paralíticos curados, tantos possessos libertados, tantas almas aquietadas outrora pelo Filho de Deus.
Mas também! Quando receberam benefícios, sentiram uma secreta humilhação de se verem tão inferiores. Quando receberam ensinamentos, sentiram um fio de revolta a lhes minar quase imperceptivelmente a admiração: porque era Ele tão austero, porque exigia tantos sacrifícios? Vendo-O agora “derrotado”, era o desabafo, o triunfo de todos os recalques, todas as vulgaridades, todas as invejas, o suco destilado de todas as infâmias.
A grande revolta dos fariseus ímpios e entregues a Satanás, dos seus congêneres em todas as classes do povo, em frente única com as antipatias inconfessadas, e quiçá subconscientes, dos tíbios, produziu este resultado supremo: o deicídio, o maior crime de todos os tempos.
Fonte: Catolicismo Nº 52 – Abril de 1955