Nesta parte, a alma condenada de Ani, conta a irmã Clara como se afastou totalmente de Deus. E este afastamento aconteceu quando ela começou a “adorar” mais o namorado e futuro marido, do que a Deus. Muitas mulheres esquecem de Deus quando se encontram apaixonadas, deixam de ir às Missas, de rezar e estar sempre em comunhão com a Santíssima Trindade e Nossa Senhora.
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Aos poucos eu própria arranjei um deus: bem privilegiado para se chamar deus; a mim bastante longe para não me obrigar a relações com ele; assaz confuso, para se transformar, à vontade e sem mudar de religião, num deus panteístico ou até tornar-me orgulhosa deísta.
Esse “deus” não tinha um céu para me galhardear nem inferno para ame amedrontar-me. Deixei-o em paz. Nisso consistia a minha adoração a ele.
No que se ama, acredita-se facilmente. No curso dos anos tinha-me eu assaz persuadido da minha religião. Vivia-se bem com ela, sem que ela me incomodasse.
Só uma coisa lhe teria quebrado a nuca: uma dor profunda, prolongada. Mas este sofrimento não veio. Compreende agora: “A quem Deus ama, Ele castiga!”
Era um dia de estio, em julho, quando a associação das moças organizava uma excursão para A. Gostava eu sim das excursões. Mas não das beatarias anexas!
Outra imagem, diferente da de Nossa Senhora das Graças de A., estava, desde pouco, no altar do meu coração. O grã-fino Max N. do armazém ao lado. Pouco antes conversáramos divertidamente algumas vezes. Convidara-me, nessa ocasião, para fazermos uma excursão naquele mesmo domingo. A outra com que costumava andar, estava no hospital.
Reparara, sim, que eu tinha deitado um olhar sobre ele. Mas eu não pensava ainda em casar-me com ele. Era afortunado, porém amável demais para com muitas e quaisquer mocinhas; até então eu queria um homem que me pertencesse exclusivamente, como única mulher. Certa distância sempre me era própria. [Isso era verdade. Com toda a sua indiferença religiosa Âni tinha algo de nobre em seu ser. Espanto-me de que também pessoas “honestas” possam cair no Inferno, se são assaz desonestas para fugirem do encontro com Deus]
Nessa excursão, Max cumulou-me de todas as amabilidades. Conversações de beatas é que não tivemos, como vocês.
No outro dia, no escritório, repreendestes-me porque não vos acompanhei até A. Contei-te os meus divertimentos domingueiros.
Tua primeira pergunta era: “Estivestes na missa?” Louca! Como podia assistir à missa, desde que combinamos a saída para 6 horas! Lembras-te, ainda, que juntei excitada: “O bom deus não é tão mesquinho como os vossos padrecos?” Agora, cumpre-me confessar-te que, apesar de sua infinita bondade, Deus toma tudo mais a sério do que os padres.
Após esse primeiro passeio com Max, assisti mais uma só vez à vossa reunião. Na solenidade de Natal. Certas coisas me atraíam. Mas interiormente, já estava
apartada de vocês.
Cinemas, bailes, excursões, seguiam-se. Brigávamos às vezes, Max e eu, mas eu sabia prendê-lo sempre a mim.
Mui desagradável me foi a rival que, de volta do hospital, se comportava furiosamente. Propriamente a meu favor. Minha calma distinta causou grande impressão a Max e obrigou-lhe, afinal, a decisão de me preferir.
Eu sabia denegri-la, rebaixá-la. Falando com calma: por fora, realidades objetivas; por dentro, atirando peçonha. Semelhante sentimentos e insinuações conduzem rapidamente ao Inferno. São diabólicos, no verdadeiro sentido da palavra.
Por que te conto isso? Para constar como fiquei definitivamente livre de Deus.
Para esse afastamento não foi preciso que eu chegasse com Max muitas vezes às últimas familiaridades. Compreendi que me rebaixaria aos seus olhos, se me deixasse esvaziar antes do tempo. Por isso me retinha, vedava.
Realmente estava eu sempre pronta para tudo que achava útil. Cumpria-me conquistar Max. Para isso nada achava caro de mais. Amamo-nos aos poucos, pois que ambos possuíamos valiosas qualidades que podíamos apreciar mutuamente. Fui talentosa e tornei-me hábil e conversadora. Cheguei, assim, a prender Max nas mãos, segura de que o possuía sozinha, pelo menos nos últimos meses antes do casamento.
Isso consistia minha apostasia de Deus, em fazer de uma criatura o meu deus. Em coisa alguma pode isso realizar-se tão plenamente como entre pessoas de diferentes sexo, se o amor se afoga na matéria. Isso torna-se seu encanto, seu aguilhão e seu veneno. A “adoração” que eu me prestava em Max, tornou-se-me uma religião vivida..
continua no próximo domingo…
1 Comentário
obrigado maria porque meu filho arrumou emprego obrigado por ter entercedido por ele